NOTA DE INTENÇÕES
O filme ENTRE SOMBRAS alicerça-se em dois grandes temas: o surrealismo e o film noir. Como no film noir, a trama desenrola-se nos anos quarenta, embora não seja refém desse horizonte temporal, visto que se inspira numa lógica surreal.
Este surrealismo manifesta-se sobretudo na cenografia, figurinos e animação: cofres-fortes onde são depositados corações resguardados em malas; quartos de hotel cujas camas engolem os protagonistas ou adereços que se mexem sozinhos; homens sem cabeça, cabeças presas em gaiolas ou cintos que tomam a iniciativa de abraçar um corpo.
A animação, através das técnica da pixilação e do stop-motion, permite transmitir conceitos mais abstratos, utilizar metáforas e construir uma narrativa cinematográfica mais plástica, mas ao mesmo tempo compreensível. A imagem real, através da pixilação, enaltece o cariz humano do filme tanto pela emoção facial como pela linguagem corporal dos actores.
O lado onírico da animação, através do stop-motion permite-nos jogar com escalas, transições e desafiar o que é considerado convencional, ajudando ao caráter surreal da narrativa.
Ao film noir ficam a dever-se as opções estéticas como o recurso ao preto e branco, à iluminação, ao jogo de contrastes e de sombras, para revelar aspectos psicológicos e sublinhar tensões, embora sempre pontuados por impressões surrealistas.
O arquétipo femme fatale é apropriado e para, subverter este estereótipo feminino, é convertido em homme fatale. Assume-se também o ponto de vista da figura feminina que se constitui como narradora da história, num registo de voz off, quebrando assim com o predomínio do discurso masculino neste género cinematográfico.
A sexualidade, tema subjacente do film noir, está também presente neste filme, no desejo que o homme fatale projecta na protagonista e no jogo de poder que decorre da relação homem/mulher, sedutor/seduzida.
No estilo visual próprio do film noir, a protagonista move-se maioritariamente em ambientes masculinos, urbanos e intimidantes. São lugares citadinos envoltos em mistério, reforçados pelo ambiente nocturno e pelos jogos de sombras. A atmosfera é desconfortável e das ruas espreitam perigos. A luz, maioritariamente em chiaroscuro, reflecte todo este ambiente de suspense e inquietação.
Os locais de filmagem oferecem uma estética Art Déco, cuja conjugação de padrões geométricos e o uso de preto e branco se coaduna com a estética do film noir.
A banda sonora de “Entre Sombras”, acompanha o percurso da protagonista, pautando a sua transformação. Começa por sublinhar a sua insatisfação e o desejo de que algo de extraordinário aconteça. A música sincroniza-se com a personagem e com as suas acções, pontuando mecanicamente o seu emprego, rotina esta que é interrompida pela chegada de um bilhete deixado por um estranho. Nesse momento inicia-se o tema que conduzirá o espectador do clichê de film noir até a um final triunfante de liberação feminina.
Em suma, “Entre Sombras” pode ser entendido como um filme Neo-noir que adopta a estética do preto e branco e imagética dos anos 40, inspirando-se no design Art Déco e no movimento surrealista de forma a criar uma narrativa com cariz feminista que utiliza estereótipos do cinema para os desconstruir de forma original e desafiante.
Homem-Troca | Rui Alexandre Osório
Mulher-Jornal | Teresa Freitas
Mulher-Escadas | Mónica Santos
Recepcionista #1 | Teresa Freitas
Recepcionista #2 | Marlene Félix
Homem-Lenço | João Pamplona
Viúva | Clara Nogueira
Homem-Gaiola | Milton Pacheco
Mulher-Chapéu/Mulher Cantora | Daniela Duarte
Mulher-Turbante | Francisca Sobral
Manequim, Mulher-Traça | Regina Machado
Homem-Abajur | Nuno Amorim
Mulher-Boca | Ana Pinto
Mulher-Camisa | Mónica Santos
Cantora | Daniela Duarte
Empregado | Gilberto Oliveira
Homem-Óculos Escuros | Davide Freitas
Homem-Mão, Mulher-Vazia | Joana Moraes
Homem-Manipulador | Simão Luís
Homem-Colete de Forças | Milton Pacheco
Mulher-Colete de Forças | Vanessa Ventura,
Sombras Arquivo | Vítor Carvalho, Pedro Medeiros, Fabrice Dugast, Mónica Santos, Vanessa Ventura, Milton Pacheco, Regina Machado